De “carona” nas licitações

Autor: Christian Pizzato de Moura

Ao abordarmos o tema “adesão carona” na análise sobre sua abrangência e validade, passamos, obrigatoriamente, a buscar cada uma dos aspectos legais que envolvem o dever de licitar da Administração Pública.

A Constituição Federal de 1988 estabelece o princípio geral de normatização do processo e institui, salvo os casos específicos previstos em lei, a regra de que todas as obras, serviços, compras e alienações serão contratadas mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes.

O regramento é complementado pela Lei de Licitações (Lei 8.666/93), que traz uma série de condições especiais e gerais.
Ela define, entre outras coisas, que as licitações têm por objetivo selecionar a proposta mais vantajosa para a administração e promover o desenvolvimento nacional sustentável. Também estabelece que as licitações devem ser processadas e julgadas em estrita conformidade com os princípios.

Juntos, são esses os instrumentos mais importantes para se observar no momento de se decidir pela realização de um processo licitatório próprio, ou limitar-se a um aproveitamento da licitação de outro órgão.

Neste contexto, o gestor deve, todavia, observar alguns detalhes importantes:

– problemas na definição do objeto: numa adesão carona, o órgão que pretende tirar proveito do processo de outro, deverá se adequar à descrição e condições determinadas por outros órgãos;

– ausência de fomento do mercado local: ao buscar essa adesão, principalmente quando realizado por Município ou unidade da federação em outro Estado, estará se privilegiando a criação de empregos e pagamentos de impostos a outros entes;

– observância dos princípios da isonomia e impessoalidade, e não somente o da economicidade: uma adesão do tipo “carona” não deve se basear na simples condições de “comprar pelo menor preço” comparando-o aos valores praticados no mercado local. Como todo o processo de aquisição pública, deve-se ter em mente a obrigatoriedade de se promover a impessoalidade e a isonomia, ou seja, dar condições iguais sem a escolha de fornecedores ou marcas.

– objetivos do princípio da publicidade: além do privilégio dado a outros mercados, em detrimento ao mercado local, a publicidade tem condão de dar conhecimento à própria sociedade e aos órgãos de controle, fato esse que será dispensado.
JURISPRUDÊNCIAS

Resumidamente, verifica-se nesses últimos anos que os entendimentos das Cortes de Contas, sobretudo o Tribunal de Contas da União (TCU), que a adesão “carona” deve ser melhor regulamentada, uma vez que seu uso incondicional vem promovendo uma crescente impropriedade nas aquisições, visto que reduzem, muitas vezes, a observância de outros princípios, entre eles o da competição, da igualdade de condições entre os licitantes, e, consequentemente, da busca pela maior vantagem para a Administração Pública, em virtude dessa inobservância da concorrência (Acordão TCU 1.487/2007, item 9.2.2).

Esse acórdão, além de propriamente impor a revisão do Decreto Federal que convalida a possibilidade legal da adesão “carona” na Administração Pública Federal (diga-se de passagem, que inspirou o Decreto Estadual nº 7.217/2006, quando promoveu a inclusão do art. 86-A), foi utilizado pelo próprio TCU na decisão proposta no Acórdão 1.233/2012, que determina uma condição de VEDAÇÃO à capacidade de se ampliar a quantidade de um item licitado, com a simples promoção da “carona”, vedando adesões acima do quantitativo registrado no momento da publicação de um edital.

Não obstante ao posicionamento jurisprudencial recente, que vem determinando a revisão dos instrumentos legais existentes, na esfera federal e que devem ser observados também por entes que adotam instrução similar, a adesão à uma Ata de Registro de Preços por meio do instituto “carona”, deve ser analisada em alguns aspectos operacionais, dos quais destacamos:

Infração ao princípio da impessoalidade: por mais que se considere que o processo administrativo que determinou certa adesão “carona” venha embasado por ampla pesquisa de preços, a discricionariedade do gestor ainda poderá estar presente em virtude da capacidade de escolha.

Inexistência de sistema unificado de informações para controle das adesões: mais preocupante ainda, quando se trata de adesões ilimitadas ou, mesmo limitadas, de órgãos de quaisquer esferas ou poderes, é o controle de quantidades de adesão.
Assim, ao se permitir adesões por meio de carona, verifica-se que os governos federal, estadual e municipal não possuem mecanismos de controle, de amplo e irrestrito acesso, que permita os órgãos de controle fiscalizar as quantidades de adesões realizadas a uma determinada Ata de Registro de Preço.

Verifica-se, portanto, uma fragilidade substancial observada no instituto “carona”, uma vez que a ausência de mecanismos de controle por parte das administrações colabora com o desvirtuamento do instituto da licitação.

Desta forma, uma vez que o instituto “carona” não deva ser encarado como “vilão”, visto que possui características inovadoras, promovendo a agilidade e a evolução, quando utilizado em prol do interesse publico, desde que respeitado sua característica de “exceção à regra” que é a licitação, sugere-se sua utilização, principalmente quando demonstrado:
A – que a mesma se origina de outras Unidades de Federação, com base nas mesmas regras de publicidade e na promoção da economia de escala, em virtude das quantidades licitadas.

B – impossibilidade de realizar um processo licitatório pelos órgãos centralizadores, devidamente fundamentado nos aspectos de “economicidade X vantajosidade”;
C – quando caracterizada a ausência de licitantes ou dentro das condições necessária para a contratação emergencial, devidamente fundamentados em relação ao preço praticado, em relação ao preço de mercado;
D – fundamentação em pesquisas de outras ARP em no mínimo 03 (três) outras unidades da federação ou órgãos federais, com fornecedores diferentes, bem como, com quantidades e prazos idênticos àquela que se pretende aderir.
E – similaridade com as regras impostas pelo Dec. Estadual nº 7.217/2006, quanto ao Edital do Certame;
F – ausência de condições previstas no art. 48, incisos I, II e III da Lei Complementar 123/2006 (ME e EPP), visto ter caráter de promoção do desenvolvimento regional das Micro e Pequenas empresas.

FONTE: http://www.jcorreio.com.br/index/noticias/id-4743/de__carona__nas_licitacoes